segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Primavera brasileira, saúde de Lula e eleições municipais

O ano de 2012, na área política, empolgará mais a nível nacional com passos estruturais na consolidação das instituições democráticas, um processo sonhado como revolução burguesa por nossos intelectuais de meados do século XX. Como será ano de eleições, a saúde de Lula definirá o rumo de alianças, refletindo tanto em São Paulo quanto em Fortaleza.


Por que revolução burguesa? O mercado se consolidou como a força estrutural na sociedade brasileira. A competitividade foi introduzida inicialmente na economia e transferida para as relações sociais. O individualismo e a ambição por bens materiais são consequências desse processo da passagem de comunidade à sociedade. O desafio agora é aproximar a sociedade civil e a política num processo que passa necessariamente pela construção de uma ética liberal democrática.

Com a redemocratização, cada presidente introduziu reformas importantes para consolidar esse quadro de modernidade: a defesa do consumidor, humanizando a competitividade; a responsabilidade fiscal, combatendo o patrimonialismo e nepotismo; definiu-se o partido como fonte de representação, para combater o “toma lá dá cá” de um presidencialismo que dialogava com pessoas; e foi feito o controle externo no Judiciário, embora ainda corporativista. Já se percebeu que o espírito parlamentarista da Constituinte de 1988, com partidos mais fortes, começa a produzir efeito, mesmo numa quebra de percurso para o presidencialismo.

Independente, pois, de políticos ou intelectuais, a sociedade civil, a única fonte de poder de uma sociedade liberal democrática, vai exercendo a soberania. Essa vontade geral, como chamava Rousseau, é expressa nas leis, mas não abdica de controlar sua efetivação. O governo Dilma tem um papel a desempenhar para reforçar as instituições democráticas ao revisar o presidencialismo de coalizão com a reforma ministerial e quebrando o controle partidário dos administradores, introduzindo o republicanismo.

Por outro lado, como vamos ter um ano típico de eleições municipais, o papel de Lula dependerá de sua saúde, embora tudo indique que será forte não apenas em São Paulo, mas em muitos municípios. Em Fortaleza, essa realidade já começa a refletir nas articulações dos partidos, sobretudo na base aliada. Embora partidos comecem a se cacifar para o embate, mas a forte influência lulista paira nas articulações. A eleição municipal produzirá fortes emoções, mas a adaptação do Judiciário à realidade de mercado, em curso, promete lances inusitados e de forte efeito democrático.

Ser otimista é um estado de espírito conjuntural e previsão é seguir tendências estruturais em andamento. Com uma economia satisfazendo a massa, o ano de 2012 trará fortes emoções no fortalecimento da democracia, seguindo uma tendência global.
 
Josênio Parente
josenioparente@gmail.com
Cientista político e coordenador do Grupo de Pesquisa Democracia e Globalização, ligado ao CNPq


quinta-feira, 25 de agosto de 2011

EM BUSCA DE UM CAMINHO





Alexandre Aragão

Pensei de colaborar, mesmo se de uma forma muito modesta, com o texto de Eric Hobsbawm, postado em nosso grupo digital, como forma de retribuir à generosa iniciativa do companheiro Luiz Alberto em compartilhar conosco da visão daquele autor sobre a problemática que nos envolve no tempo presente.

O artigo de Hobsbawm é provocador na medida em que ele mesmo denuncia o desconhecimento, por parte da humanidade, da gravidade e da duração da atual crise sistêmica, ao mesmo tempo em que não se sabe como superá-la nem como fazer: “todos estão como um cego que tenta sair do labirinto tateando as paredes com todo tipo de bastões, na esperança de encontrar o caminho da saída”.

Esta imagem me reporta a duas outras imagens não menos significativas.

A primeira, trata da passagem do livro de José Saramago, ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA, quando a única pessoa – uma mulher, que continuou vidente naquela multidão de cegos, vai em busca de alimentos para o seu grupo de amigos e, ao entrar no breu do porão de um armazém, acende um minúsculo fósforo e, com aquela maravilhosa e pequenina luz, pode enxergar os mantimentos e reparti-los com seus companheiros e companheiras. Não era uma preocupação apenas consigo que a movia, mas o sentido do outro, dos outros. E bastou apenas a luz de um frágil fósforo para iluminar o caminho.

A segunda imagem me transporta para a belíssima composição de Caetano Veloso, UM ÍNDIO, que em uma de suas estrofes exclama: “E aquilo que se revelará aos povos/ Surpreenderá a todos não por ser exótico/ Mas pelo fato de poder ter sempre estado oculto/ Quando terá sido o óbvio//”. Olhar para o índio: quem dera o Angelus Novus, de Benjamin, o pudesse fazer...

A busca de um sentido foi também o tema com que o pontífice Bento XVI desenvolveu seu discurso de acolhida à juventude para a Jornada Mundial, em Barajas, na Espanha: “Venho me encontrar com milhares de jovens, de todo o mundo, à procura da verdade que dê sentido genuíno à sua existência (...). Eles sabem que, sem Deus, seria difícil afrontar estes desafios e ser verdadeiramente felizes (...). Com Ele ao seu lado, terão luz para caminhar, razões para esperar e hão de motivar os seus generosos compromissos para a construção de uma sociedade onde se respeite a dignidade humana e uma efetiva fraternidade”.

O fósforo, a luz...

Ser humano é tomar a consciência de que possuímos o mesmo gérmen que nos faz húmus e nos denomina degermanus, ou seja, hermanos.  Quiçá, com a chama deste pequenino e óbvio fósforo, possamos encontrar um novo caminho para a vida em nossa sociedade local-global, que respeite, garanta e promova este princípio básico da democracia.

Hobsbawm lembra que um problema que pode unir a humanidade é a luta contra a crise do meio ambiente. Afinal, sem as fontes da vida natural, a humanidade não pode existir. Entretanto, é bom lembrar que o inverso também é verdadeiro: sem a vida humana, a natureza perde o seu sentido de ser, na medida em que a humanidade é a expressão consciente do ecossistema Vida.
Assim, é preciso cuidar do Húmus como um todo: de sua matéria e de seu espírito.

A crítica que o autor deflagra contra o socialismo já fora produzida por diversos pensadores. E a história nos ajuda na revisão da importância da produção desses pensamentos, principalmente daqueles que ocorreram, não após o falimento das experiências socialistas ditas reais, mas no momento em que elas se iniciavam, como é o caso de Theilard de Chardin.

Entre outras coisas, ele afirmava que na medida em que “os primeiros ensaios socialistas pareceram inclinar-se perigosamente para um regime ou um estado infra-humano de formigueiro ou cupinzeiro, não é o princípio mesmo de totalização que se equivoca, mas a maneira inadequada e incompleta com que é aplicado”.

Para ele, os humanos precisavam despertar para o sentido da solidariedade universal, fundada na sua comunidade profunda de natureza e de destino evolutivo. Não era a dureza ou o ódio apregoado pelo leninismo, mas uma nova forma de amor, ainda não experimentada pelo Homo, que faz prognosticar e que leva nas suas dobras a onda que cresce em torno de nós, daquilo que Chardin chamava de planetarização. Como já disse Noam Chomsky, sem laços de solidariedade, de simpatia e de preocupação com os outros, uma sociedade que se pretenda socialista é impensável.

Por outro lado, a crítica ao capitalismo se torna cada vez mais atual, na medida em que esse sistema econômico não consegue produzir o bem para a humanidade; pelo contrário, gera um apartheid social incapaz de garantir uma distribuição justa dos bens produzidos socialmente.

O brasileiro Milton Santos, por exemplo, assinalou que a globalização hegemônica atual é o ápice do processo de produção capitalista, caracterizado pela expansão-superação das fronteiras dos Estados nacionais, tornando-as porosas, envolvendo todas as dimensões da realidade humana: econômica, política e simbólica. A globalização não é apenas a existência desse novo sistema de técnicas. Ela é também a emergência de um mercado dito global, responsável peloessencial dos processos políticos atualmente eficazes. Os fatores que contribuem para explicar a arquitetura da globalização atual são: a unicidade da técnica, a convergência dos momentos, a cognoscibilidade do planeta e a existência de “um motor único na história”, representado pela mais-valia globalizada. Um mercado global utilizando esse sistema de técnicas avançadas resulta nessa globalização perversa. Isso poderia ser diferente se o seu uso político fosse outro. Esse, para o autor, parece ser o debate central.

Voltando a Hobsbawm, nota-se que o seu olhar parte da experiência britânica, da debandada do partido trabalhista, personificado em Tony Blair, para o lado neoliberal, adotando todos os procedimentos doutrinários dessa cartilha teológica, como ele denominou.

Seu correspondente no Brasil estava representado numa caricatura de social-democracia, cujo líder máximo, Fernando Henrique Cardoso, seguiu determinadamente o que aquele receituário apregoava, colocando, ao final do seu governo, o Brasil numa situação altamente vulnerável. Em dezembro de 2002, o quadro econômico brasileiro deixado por FHC era o seguinte: o dólar custava R$ 3,63 (três reais e sessenta e três centavos), registrando uma maxidesvalorização cambial desde a implantação do real da ordem de 327%; as reservas internacionais desabaram para o valor irrisório de US$ 27 bilhões, após uma onda de privatizações generalizadas, sendo necessário nessa época fazer um empréstimo emergencial ao FMI de US$ 30 bilhões; o salário mínimo alcançou nessa época o valor real de US$ 56, uma perda em torno de 37% desde a implantação do real como moeda nacional; o chamado Risco Brasil atingiu o índice de 2.436 pontos, a taxa de desemprego alcançava índices recordes (BANCO CENTRAL, 2009).

Imaginemos o que teria sido para o Brasil, e para o seu povo, enfrentar uma crise sistêmica do capitalismo global se não tivesse ocorrido mudanças dos rumos do governo, com a reorganização estratégica do Estado, mediante a posse de Lula em 2002?

Lembrando que, em 2003, coube ao Brasil, na pessoa do presidente Lula, ocupar presidência da Comissão Americana que estava para decidir a entrada do Brasil na ALCA. Fernando Henrique estava trabalhando diuturnamente para isso ocorrer; quem barrou a entrada do Brasil na ALCA foi justamente o novo governo que tomou posse.

Assim, qual era a tarefa histórica urgente que o novo governo precisaria assumir?

Implantar transformações capazes de reverter o quadro de instabilidade, alterando-o para um ambiente produtivo. Era preciso reduzir substancialmente a vulnerabilidade brasileira a choques advindos de fluxos de capitais estrangeiros e variação de preços; consolidar a estabilização da moeda que se encontrava sob ameaça real; acumular reservas internacionais e poupança interna, recuperar a credibilidade do país externamente, para somente assim pensar em crescimento, orientado por uma estratégia de longo prazo, com premissas tais como inclusão social e desconcentração de renda, com crescimento econômico e ambientalmente sustentável, buscando reduzir disparidades regionais, dinamizado pelo mercado de consumo de massas e fortalecimento da cidadania e da democracia. E isto não era uma tarefa do Mercado, mas do Estado democrático.

Foi necessário adotar ações que promovessem a inclusão social e a cidadania por meio de acesso à propriedade, a bens e serviços e à universalização de direitos, bem como a superação da marginalização, o combate às desigualdades, buscando uma resposta eficaz ao problema da construção de uma estratégia socialmente inclusiva e transformadora de desenvolvimento, promotora da redução das desigualdades sociais e regionais de forma sustentável.

Que resultados podem-se aferir com essa mudança de rumo?

Em 31/12/2008, o salário mínimo atingia a marca recorde histórica de US$270. A cotação do dólar nessa mesma época despencou para US$ 1,71 (menos da metade que em 2002). As reservas internacionais nesse período já atingiam o valor recorde histórico de US$ 206,8 bilhões. E o chamado Risco Brasil desabou para 224 pontos, caindo a 10% do valor de 2002 (BANCO CENTRAL, 2009).

Portanto, talvez fosse interessante para o Hobsbawn criticar não apenas a politica britânica, mas também conhecer o que outros países estão fazendo, como é o caso do Brasil, na tentativa de encontrar novos caminhos para a construção da sociedade.

Para concluir, gostaria de registrar as palavras do meu grande amigo Luigino Bruni, para quem não se pode fazer nenhuma experiência autenticamente intelectual se a teoria e os pensamentos que se compreendem e se escrevem não se transformam na vida de quem os elabora e os escreve. Se se quer contribuir para uma nova teoria da solidariedade humana, a coisa verdadeiramente importante, e também a mais decisiva, que se deve fazer é tornar-se dia após dia uma pessoa solidária em todos os contextos da vida. Não é possível escrever e falar de dom, de comunhão, de gratuidade, de solidariedade sem ser dom, comunhão, gratuidade e solidariedade. A vida é maior e precede todo conceito. E só a vida salva, verdadeiramente, a nós e os outros.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

segunda-feira, 18 de julho de 2011

NOTÍCIAS DE ANGOLA


DIVIOL RUFINO

Querido amigo Alexandre,

Estou na África, precisamente em Angola (Luanda). Amanhã parto para Moçambique, em missão de Paz, de revigoramento pessoal e de perdão dentro das comunidades eclesiais, também aqui em Angola.

Aqui em Angola faz parte da memória oral, que um grupo de pernambucanos, de origem holandesa, partiu de Recife em 31 de maio de 1640, invadiu Luanda, em Agosto de 1641 para capturar escravos para os Engenhos de cana de açúcar de Pernambuco, enviados pelo Sr. Johan Maurice, conde de Nassau. Seus homens fizeram um verdadeiro massacre que durou sete anos e deportaram milhares de angolanos.

 Ontem estive no museu da escravatura, onde há um registro de que mais de 4,5 milhões de pessoas foram arrancadas de suas vidas, de seus familiares, de seus reinos e foram sumariamente deportadas, dos quais 30% morreram lançados ao mar. As imagens e os relatos aqui expostos são aterradores (inéditos no Brasil).

Tenho aproveitado dessa minha presença para, em cada encontro, em cada celebração, em nome do meu povo pernambucano e brasileiro, pedir PERDÃO por este gesto monstruoso, bem como para AGRADECER por tudo o que os Angolanos deram de si para a construção do nosso Estado e do nosso País.

Nesses dias temos tido momentos fortíssimos de PERDÃO, experimentado como sendo a única força capaz de sanar as profundas feridas, ainda vivas, na tradição oral desse povo tão belo, tão digno, tão honrado, mas ao mesmo tempo tão martirizado e explorado, inclusive pelas guerras recentes.

Quando parti do Brasil, no início de junho, não imaginava minimamente o que Deus estava reservando pra mim nessa viagem que, acredito, será - aliás, já é - um marco em minha vida e na de tantas pessoas que tenho encontrado nesse percurso totalmente elaborado pela criatividade Dele, em cujas mãos me abandono.

Como tu sabes, a responsável pelo Movimento dos Focolares, em Angola, São Tomé e Príncipe, Moçambique (onde me encontro até o dia 22.07) e Zâmbia é Ana Maria Santanchè. Posso te assegurar que ela se tornou mesmo uma coisa só com esse povo: de italiana virou africana com os africanos, com seu sofrimento, com sua dor e, concretamente, faz de tudo para minorá-lo.

Sinto-me honrado em poder colocar-me à disposição para compartilhar com ela, e com as demais focolarinas que estão aqui há mais de 20 anos, oferecendo-se com todas as energias e criatividade para elevar as pessoas à sua mais alta dignidade de filhos e filhas de Deus.

O que tenho feito não é nem mesmo uma gota no oceano de sofrimento, de abandono, de descaso que essas nações sofrem em relação ao resto do mundo, que só pisa aqui para explorar suas riquezas naturais - que são muitas - e entorpecer suas mentes com falsas promessas, ou mesmo despejando drogas, álcool, seitas e até novelas brasileiras que invadiram as casas, quebrando um elo milenar que até então era forte, o senso de família.

Um grande país asiático, por exemplo, aceitou a proposta de “contribuir” para o desenvolvimento desses povos, sem impor contrapartida, contudo, seus produtos invadiram os mercados levando à quebradeira geral os empreendedores e o comércio local, pois ninguém consegue concorrer aos seus produtos; sem falar que as melhores e modernas rodovias que estão se fazendo por toda parte- além de não empregarem a mão de obra local, pois praticamente todos vêm do referido país, todas as estradas seguem numa presumível direção: às minas de diamantes que já saem em "malas blindadas" para lá.

Só pra te dizer um caso, em Luanda, nesse momento, com a chegada dos chineses, para a construção civil; dos italianos, que exploram petróleo; dos brasileiros, etc., um apartamento de dois quartos, no momento em Luanda, não sai por menos de US$ 7.000 o aluguel mensal. O povo foi literalmente empurrado para a periferia da periferia, sem água, esgoto ou saneamento básico, como nova forma de escravidão e de colonialismo disfarçado de cooperação, pois o povo não teve tempo de ser erguer, pois uma geração inteira ficou sem frequentar escolas e universidades por terem sido confinadas nas matas em luta armada.

Milhões de pessoas migraram de suas regiões por causa da guerra e do perigo das minas e nunca mais voltaram. Resultado: a capital que era mais protegida por ser a sede do governo, virou um caos e inchada, sem água nem luz para todos.

Portanto, amigo, o que tenho feito com as pessoas é ouvi-las, é deixar a dor fluir, sem alimentar ilusões, mas sem apagar a esperança, mesmo que tardia virá! Tenho mostrado a elas que precisam mantar aceso o sonho de liberdade, que eles são fortes, resistentes e que as guerras pelas quais passaram que esfacelou suas famílias e seus sonhos não teve, no ódio, a última palavra. Que eles estão vivos, não obstante tudo que passaram.

Hoje, visitando uma comunidade muçulmana, aqui em Maputo - Moçambique - um jovem usou uma expressão, dirigindo-se a outro que experimentava na cabeça uma espécie de solidéu que eles usam: "Amigo, Alá é quem te deu esta cabeça grande porque assim ele quis. Se ele a conserva até hoje é porque Ele quer assim, o importante é que a uses bem. Alá é grande!".

É nessa fé em Alá, bem como no Deus dos cristãos que essa gente encontra forças e esperança em dias melhores, talvez é por isso que suas liturgias são abundantes, seus cantos envolventes e emocionantes, suas preces vão junto com o balouçar dos seus corpos geralmente bem ornados de honra, de dignidade, de beleza.

Asseguro-te, estou marcado por tudo o que tenho vivido aqui. Tenho - agora- mais certeza: “será a beleza que salvará o mundo” e aqui é o que não falta! Esta beleza, escravagista algum conseguiu lhes arrancar.


segunda-feira, 11 de julho de 2011

CARPE DIEM


Alexandre Aragão
No dia 29 de junho passado, realizou-se em Brasília, integrando o Ciclo de Debates promovido pelo IPEA, um seminário intitulado QUE TRABALHO DOMÉSTICO QUEREMOS PARA O BRASIL DO SÉCULO XXI?

Até a década de 1970, as trabalhadoras domésticas eram desconsideradas como um grupo produtor de trabalho, ou seja, não faziam formalmente parte do Mercado, consequentemente não eram objeto de direitos trabalhistas e sociais. As leis “colonialistas” vigentes na ditadura militar até então as tornavam invisíveis.

Com o retorno do Brasil à democracia, a luta democrática retorna à cena política, e a Constituição de 1988 garantiu-lhes os seus primeiros direitos: salário mínimo, o 13º. salário, a licença maternidade. Mesmo assim, manteve-se o tratamento desigualàs trabalhadoras domésticas, deixando de estender a elas o mesmo rol de direitos assegurados aos demais trabalhadores brasileiros. O artigo 7º. da Carta Magna, produzido pelos constituintes eleitos no contexto político de 1986, por meio da inclusão de um parágrafo único, restringe direitos à categoria das trabalhadoras domésticas.

Vê-se assim brevemente, nessa seta de tempo, um desenrolar de correlação de forças que fazem desenvolver um processo de mudança de concepções, de comportamentos e, consequentemente, de cenários, a partir da redemocratização do país. As trabalhadoras domésticas estão na luta, como agentes sociais (na visão seniana) para tornarem-se visíveis e garantirem seu espaço-cidadão na Sociedade [e no Mercado]. O princípio da igualdade requerido por uma sociedade democrática implica a liberdade de luta pela conquista da cidadania, com a ampliação de direitos e a formalização de novas normatizações. Isto, na ditadura de 1970, para as trabalhadoras domésticas, talvez fosse muito difícil de imaginar; mas agora já é uma realidade possível.

Com esse fato pretendo continuar a pensar um pouco sobre a existência humana. Ela comporta pelo menos três tipos de modalidade: a realidade, a necessidade e a possibilidade. Segundo alguns autores contemporâneos, realidade e necessidade foram modalidades com as quais a filosofia e a ciência se preocuparam demasiadamente, negligenciando a dimensão da possibilidade.

Mas o que seria, então, o possível?

No momento em que negamos uma determinada realidade, indica que estamos querendo afirmar algo diferente, mesmo quando não sabemos exatamente o que é esse querer.

Como lembra Manfredo de Oliveira, o ser humano é aquele que pode levantar a questão da validade sobre a sua práxis, sobre aquilo que deveria ser e não é, e sobre aquilo que não é e deveria ser. A ética emerge nesse contexto, como reflexão crítica destinada a tematizar os critérios que permitam superar o mal para conquistar o bem à humanidade. Seu objetivo fundamental é estabelecer o marco no qual seja possível configurar o mundo humano enquanto espaço efetivo de liberdade e justiça para todos (OLIVEIRA, 2008).

Por um lado, ser livre é ser capaz de dizer não. É libertar-se da dependência interna - por exemplo, do instinto; e externa - por exemplo, de uma coação. Um ente é positivamente livre na medida em que possui a si mesmo e tem nessa relação consigo mesmo o fundamento do seu ser e do seu agir. No ser humano livre emerge a capacidade de controlar os impulsos em função de um fim mais alto, degrau entre a vontade natural e a vontade verdadeiramente livre.

Mas a liberdade não pode esgotar-se na esfera da arbitrariedade da vontade, do ponto de vista do indivíduo isolado em si mesmo, de uma subjetividade atomizada, onde o particular enquanto particular é o essencial, o absoluto. O ser humano é igualmente um ser em relação, um ser de um mundo já feito e ao mesmo tempo sempre por fazer. Assim, não há liberdade sem processo de libertação (BOFF, 1986). A liberdade humana só é liberdade efetiva enquanto liberdade no mundo da natureza e da sociabilidade, ou seja, quando ela se faz fundamento que alicerça a relação com a natureza e a vida comum dos sujeitos
entre si.

Se a liberdade num primeiro momento é transcendência, autonomia do eu sobre toda a fatalidade, e se num segundo momento é decisão, tomada de posição diante de uma multiplicidade de possibilidades, ela só se PLENIFICA na medida em que se exterioriza, se faz mundo, se autoconfigura como ser efetivo na natureza e na sociedade. A liberdade efetiva é liberdade enquanto construção intersubjetiva de relações, a construção do ser pessoal como um-ser-com-a-alteridade, decisão a respeito da configuração específica desse ser-com. Assim, o que está em jogo no processo de libertação e o que torna possível a constituição de sujeitos enquanto sujeitos é esse processo de construção de COMUNHÕES como espaço de efetivação da liberdade na contingência dos eventos.

Nem interioridade pura, nem exterioridade pura podem construir a liberdade. Ser humano significa conquistar-se como ser livre e o caminho para chegar lá é cada individualidade compreender-se não como realidade isolada, mas construir um mundo que seja efetivador da liberdade onde cada um existe para si enquanto existe com o outro, pelo outro e para o outro (OLIVEIRA, 2008).

É na vida em comum que se pode exercer a possibilidade de outras configurações de mundo, a partir do diálogo e do respeito ao outro. A garantia do respeito ao outro deve ocupar lugar central em uma sociedade democrática e republicana, a qualquer outro, com sua inclusão integral na vida da sociedade. E isso é atribuição não somente do Estado, mas da Sociedade como um todo, incluindo-se logicamente o Mercado, numa dinâmica trialógica entre essas três esferas.

Como lembra Tocqueville (2005), não há grandes povos sem a ideia dos direitos humanos; não há grandes homens sem respeito aos direitos humanos: pode-se dizer que não há sociedade, pois o que é uma reunião de seres racionais e inteligentes cujos únicos vínculos são o egoísmo e a competição?

Então, somente quando palavra e ação não se divorciam, quando as palavras não são vazias e os atos não são brutais, quando as palavras não são empregadas para velar intenções, mas para revelar realidades, e os atos não são usados para violar e destruir, mas para criar relações e novas realidades, tem-se uma verdadeira realização política, na liberdade.

Segundo Hannah Arendt (1993), o milagre da liberdade está inserido nesse poder de iniciar. O termo grego archein significa iniciar e comandar, isto é, ser livre; o termo latino agere significa por em movimento, isto é, desencadear um processo. Se o sentido da política é a liberdade, então isso significa que nós, nesse espaço, e em nenhum outro, temos de fato o direito de ter expectativa de “milagres”. Não porque se acredite (religiosamente) em milagres, mas porque os humanos, enquanto puderem agir, são aptos a realizar o improvável e o imprevisível, e realizam-no continuamente, quer saibam disso, quer não.

Somente dessa forma, conforme a autora, a política pode dar sentido à existência coletiva na terra. Na convivência ética entre seres livres e iguais, as dimensões deontológica e teleológica da ação política precisam desenvolver um diálogo dinâmico e sintonizado entre si na busca da construção do bem humano coletivo. É um percurso extenuante. Ou como diria Celso Furtado, “um longo amanhecer”.

Para o sociólogo Boaventura de Sousa Santos, a possibilidade é o movimento do mundo. Ele divide em três momentos o caminhar da possibilidade: 1) o momento da carência (onde emergem as manifestações de algo que falta); 2) o momento da tendência (onde começam a clarificar processos e sentidos); 3) o momento da latência (onde se apontam para os caminhos a serem trilhados no processo).

A carência é o domínio do Não. A tendência é a compreensão do Ainda-Não, ou seja, a compreensão no presente de uma possibilidade incerta, mas nunca neutra. E a latência é o domínio do Nada ou do Tudo, uma vez que essa possibilidade tanto pode redundar em frustração como em esperança. Por isso Boaventura aponta para a necessidade de conhecer bem as condições de possibilidade da esperança, buscando-se definir bem os princípios de ação que promovam a realização dessas condições.

Um elemento importante destacado pelo autor trata da qualidade da dimensão subjetiva, que leve adiante essa possibilidade, alicerçada numa consciência cosmopolita, que não desperdice as experiências que indivíduos e grupos realizam pelos quatro cantos da Terra, em busca de encontrarem respostas às suas insatisfações. É um movimento que vai ao encontro do conhecimento das experiências sociais quanto das expectativas sociais. Muitos dos movimentos emancipatórios das últimas décadas começaram por experiências sociais locais
travadas contra a exclusão social.

Neste sentido, Bovantura propõe uma ecologia dos reconhecimentos, que vá numa direção contrária às lógicas atuais de desqualificação de práticas experienciais de emancipação social que resultam imediatamente na desqualificação dos agentes. Para ele é preciso alargar o círculo das reciprocidades, criando novas exigências de inteligibilidade recíproca, uma vez que ocorrem uma multiplicidade de formas de resistência e de luta que mobilizam diferentes atores coletivos, vocabulários, práticas e recursos nem sempre inteligíveis entre si, o que pode colocar sérias dificuldades para o diálogo político.

Em cada momento, há sempre um horizonte limitado de possibilidades e por isso, diz Boaventura, é importante não desperdiçar a oportunidade única de uma transformação específica que o presente oferece. Carpe Diem.

sábado, 2 de julho de 2011

CAMINHOS PARA O DESENVOLVIMENTO HUMANO



Alexandre Aragão



Retomando nosso diálogo, primeiramente eu gostaria de retornar àquele pequeno exemplo concreto, que no meu modesto entender não parece ser tão pequeno assim como você enfatizou anteriormente ao dizer “põe pequeno nisso”.

Se pensarmos que uma microempresa cearense (portanto, não estamos falando de multinacional) conseguiu, em apenas dois anos, sem recursos advindos de fontes de financiamento externo, aumentar a venda de produtos populares por ela comercializados em 200% - de 1.000 unidades para 3.000 - não me parece que seja algo que deva ser desprezado. Sobretudo porque estamos falando de consumo de massa e de geração de renda, e não de consumo de bens de luxo, como ocorria nos modelos de desenvolvimento pensados em épocas anteriores no Brasil.

Penso que, para um pesquisador sensível, esse dado não pode ser visto, aprioristicamente, como um fato isolado: nessa “fumaça” pode, quem sabe, haver “outros fogos” e “outras razões” desconhecidas que levaram a produzir essa centelha de crescimento.

Quais seriam essas razões? O que significaria, por exemplo, para a indústria ter de aumentar, numa mesma proporção de 200%, a produção de seus itens? Quantas vagas de empregos diretos teriam que ser preenchidas para que essa alavancagem ocorresse? São perguntas que podem surgir, na medida em que se vá estabelecendo uma relação entre os dados microeconômicos encontrados com os dados macroeconômicos. E, se não estou enganado, parece que o problema atual da inflação tem haver com algo semelhante, com a velocidade do crescimento econômico no Brasil nos últimos anos.

Gostaria de relembrar alguns aspectos do pensamento de AmartyaSen, de quem não sou especialista como você o é, mas para aprofundarmos o debate, arrisco-me a percorrer brevemente alguns pontos do seu pensamento onde vamos encontrar uma forte reflexão sobre a importância da democracia nas sociedadescontemporâneas, que é o ponto central de minha reflexão.

Quando perguntaram a Sen qual tinha sido o acontecimento mais importante do século XX, ele respondeu sem hesitação: a emergência da democracia . Para ele, qualquer país se prepara para a democracia através do exercício democrático, o principal caminho pelo qual as sociedades podem alcançar um progresso econômico esocial. Portanto, trata-se de um percurso a ser percorrido. Nada de situações idealizadas como pensavam alguns intelectuais clássicos dos séculos passados.

O primeiro dos papéis da democracia, segundo o autor, é sua importância intrínseca:a garantia de manifestação dos sujeitos como a capacidade básica do ser humano em participar social e politicamente da vida em comum.

Em segundo lugar, ele destaca o valor instrumental da democracia: na medida em que são ouvidas, as pessoas buscam a satisfação de suas necessidades. Desse modo, a democracia é vista como um catalisador do desenvolvimento, favorecendo o atendimento das demandas sociais.

Por último, Sen sinaliza para o papel construtivo da democracia na definição dos problemas das sociedades, uma vez que as necessidades de uma dada sociedade não são um dado absoluto, mas uma construção baseada na noção do que pode sermelhorado. Quando um problema parece insolúvel, o livre fluxo de informações propiciado por uma democracia autêntica garante a construção de melhores conceitos, consequentemente uma visão mais ampla da sociedade, de seus problemas e da busca de suas soluções.

Assim, a ação livre das pessoas é essencial para a superação dos problemas, sendo a superação dos problemas entendida como o exercício central do desenvolvimento. Portanto, nessa visão, o desenvolvimento consiste em percorrer um caminho que remova os vários tipos de restrições que deixam às pessoas pouca escolha e pouca oportunidade para exercerem sua ação racional.


Logo, o ponto de partida da abordagem seniana reside na identificação da liberdade como o principal objeto do desenvolvimento: liberdade econômica, liberdade política, liberdades sociais e culturais.


Então aqui entra a figura do Mercado, como uma das dimensões civilizadoras da humanidade. Não a única, logicamente. A liberdade de trocas e de transações é em si mesma parte das liberdades básicas a que as pessoas atribuem valor.


Podemos, nesse caso, voltar a Marx, que em sua critica da economia politica ressaltava duas condições básicas para a realização das trocas no mercado: a igualdade e a liberdade dos agentes. Segundo este autor, o grande acontecimento da históriacontemporânea de sua época havia sido a Guerra Civil estadunidense, na qual os homens lutavam para ter a liberdade de espaço no mercado de trabalho contra o sistema econômico da escravatura vigente em algumas colônias.


Então, mediante o acima exposto, surge a pergunta: estaria ou não o Programa Bolsa Família contribuindo para a ampliação do exercício da liberdade das pessoas? De que forma? Em que níveis e diversificações?


Importante lembrar que o PBF não é o único programa social e econômico desenvolvido pelo Estado brasileiro nos últimos 9 anos. Existe um conjunto de programas que resultam da visão estratégica do Governo federal, no sentido de atingir um desenvolvimento na perspectiva que aqui foi apresentada.

Afinal, como encontramos em Sen, as liberdades instrumentais – liberdades políticas, disponibilidades econômicas, oportunidades sociais, proteção da segurança e garantias de transparência - ligam-se umas as outras com a finalidade de atingir a totalidade daliberdade humana.


Assim, acho que esse aquecimento da atividade econômica das pessoas não esteja acontecendo apenas naquela lojinha. É preciso ler outros indicadores e fazer uma leitura mais articulada dos dados, buscando compreender uma verdade sempre mais profunda.


E aqui gostaria de abrir um espaço para uma reflexão em torno do outro – pessoa e grupos – e de sua importância para a construção do caminho democrático apresentado por Amartya Sen.


O outro – não apenas o outro igual, mas o outro diferente – é imprescindível para a realização da democracia. A democracia é essencialmente um sistema político que necessita de um amplo relacionamento dialógico entre pessoas e entre instituições. O ser humano está integralmente e continuamente olhando para si e olhando para o outro. Ele não pode prescindir do outro para poder transformar-se a si mesmo e transformar o espaço social ao seu redor.


Essa universalidade da relação eu-e-o-outro não exclui nenhuma categoria de pessoas, afinal todos possuem o mesmo gérmen humano.


A sociedade complexa da alta modernidade, como definem alguns autores, apresenta uma situação social que não é nova, mas que de um certo modo está carregada de nova complexidade, devido à presença de estruturas e instituições que estão presentes como mediadoras da relação entre as pessoas.


Como então, compreender a importância das instituições na vida relacional?

A instituição – política, econômica, social e cultural – é o terceiro elemento que se insere na relação face-a-face, criando um novo tipo de relacionamento humano, agora não mais direto, onde do outro não conhecemos nem a face nem o nome. Entretanto, o fato desse anonimato não significa que o outro perca sua dignidade enquanto pessoa. Cada um, portanto, que é atingido pela ação institucional, continua sendo uma pessoa distinta que somente posso alcançá-la mediante os canais institucionais.


As instituições, assim entendidas, podem ser instrumentos que ajudam a alargar, ampliar e estender a rede de relações humanas. Naturalmente isso não se dá de forma automática e estável, mas envolve sempre a vontade, inteligência, conhecimento e escolhas dos agentes com nelas engajados e das pessoas em geral. As instituições não se renovam por si mesmas; dependem da renovação das pessoas e de seu compromisso em incidir sobre as instituições, continuamente, para modificá-las, aprimorá-las.


Portanto, concebo que a crítica às instituições e às políticas que vêm sendo adotadas no Brasil precisa fazer uma leitura ampla e objetiva, buscando compreender as motivações, estratégias, realizações e contradições. Seguindo o pensamento de Boff, deve ser uma crítica substantiva e não adjetiva, tendo presente que o outro é sempre um-outro-de- mim, sem o qual não posso construir o espaço social. Penso que, dessa forma, poderá contribuir bastante para o desenvolvimento de nossa liberdade e o aprimoramento de nossa democracia.


É uma caminhada de aprendizagem continua. Não apenas de crítica, mas conjuntamente de autocrítica.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

O Estado da Palestina já!


EMIR MOURAD


O fato de Israel ter vencido guerras não o faz regulador de normas internacionais nem exime o país das infrações cometidas perante as leis



A questão fundamental para a solução do conflito entre palestinos e israelenses é reconhecer que os países-membros da ONU possuem direitos e deveres que regulam a convivência civilizada entre nações, Estados, governos e povos.
Israel, dentre diversas resoluções do Conselho de Segurança e da Assembleia Geral, acatou, até hoje, uma só resolução: a que aceitou Israel como membro da ONU!
A Palestina existe de fato antes de Israel ser criado em maio de 1948: uma cultura milenar, um povo organizado na cidade e no campo, em maioria árabe muçulmana e cristã, com minoria judaica, todos pertencentes à sociedade palestina, com instituições sociais, industriais, educacionais, faltando só o reconhecimento de direito para estabelecer seu Estado independente. O estabelecimento do Estado da Palestina é questão de direito! 
Vez ou outra nos deparamos com opiniões "desinformadas" sobre a demografia da época do mandato britânico sobre a Palestina, tais como "o território que a ONU destinou aos judeus já continha maciça maioria judaica".
Nos dados da ONU consta que, em dez dos 16 subdistritos administrativos, a população palestina perfazia mais de 82% do total da população. A Comissão de Inquérito Britânico-Americana, em 1945 e 1946, apresentou relatório com os dados de 1,269 milhão (67,6%) de árabes palestinos e 608 mil judeus residentes dentro das fronteiras do mandato da Palestina.
Sobre as guerras ocorridas em 1948, 1967 e 1973, todas as resoluções da ONU se referem às ações da "potência ocupante", Israel, e à ilegalidade de ocupar, colonizar e anexar territórios pela força militar.
Além da responsabilidade histórica de Israel pela expulsão dos refugiados palestinos.
Quanto aos judeus que foram expulsos de países árabes, eles obtiveram a cidadania israelense e deixaram de ostentar o direito de reivindicar qualquer status de refugiados, diferentemente dos refugiados palestinos, que hoje somam quase 5 milhões e são reconhecidos como refugiados segundo o estatuto da ONU e o direito internacional.
O conflito tem proporções internacionais, já que foi criado pela própria ONU e pelas intervenções de várias potências, em decorrência de seus interesses econômicos na região do Oriente Médio.
O fato de Israel ter vencido guerras não o faz regulador de normas e leis internacionais nem o exime de infrações cometidas perante a lei! 
Em julho de 2004, a Corte Internacional de Justiça proferiu uma sentença, por 14 votos a um, declarando ilegal e pedindo a demolição do muro que Israel construiu nos territórios ocupados.
A representante do Brasil na ONU, embaixadora Maria Viotti, em seu relato sobre a questão palestina, declarou, em 21 de abril de 2011: "As atividades de assentamento na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental são ilegais e um obstáculo à paz".
Os palestinos, em setembro próximo, vão pedir que o Estado da Palestina seja reconhecido como membro das Nações Unidas, tal como Israel o foi em 1949. Se Israel continuar negando esse direito aos palestinos, estará negando a razão de sua própria existência!


EMIR MOURAD, engenheiro civil, é diretor da Federação Árabe Palestina do Brasil.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


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